A Catarina Costa tem 13 anos e um sonho: ser actriz de teatro. Uma vocação que nasceu das noites de natal passadas com os primos - "somos muitos" -, nas quais se entretêm a representar para a família. No ano passado inventaram uma peça, intitulada "A história", onde cada um contava precisamente uma história da sua autoria. No final, ninguém se entendia porque queriam falar todos ao mesmo tempo. A intenção era mesmo essa. Mostrar que a falta de entendimento também pode dar origem a momentos divertidos. "Já tentei organizar uma peça na escola mas não consegui. Os meus colegas, coitados, são todos uns nabos, não percebem nada..." Ri. "Mas até hoje já quis ser tanta coisa (veterinária e arquitecta, por exemplo) que se calhar ainda mudo de ideias". A mãe da Catarina é professora de Matemática. "Talvez por ter sido sempre boa aluna à disciplina e haver mais professores na minha família. Mas não tenho a certeza, porque ela nunca me explicou". Apesar de se encontrarem diariamente na mesma escola, "ela não pode ser minha professora. É proibido". A norma não é assim tão descabida. "Se não fosse assim estavámos sempre uma com a outra. Era aborrecido...". A proximidade entre ambas leva, inevitavelmente, a comentários por parte dos colegas. Alguns dizem-lhe que gostam dela, outros nem por isso. "Houve alguém que uma vez me disse que a "curtia" por ter sido ela a dar-lhe a primeira bofetada", diz. Noutras ocasiões pedem-lhe que desempenhe o papel de "espia" e descubra a nota deste ou daquele teste. "Nem sempre pergunto, mas quando o faço nunca digo aos meus colegas. Era errado", admite a Catarina. No ano passado, "os alunos dela eram muito fraquinhos". Numa turma de quinze alunos, apenas dois conseguiram chegar à positiva. "Este ano acho que são melhorzinhos". Tal como ela própria, aliás. "Quando estudo sou boa aluna, quando não estudo, paciência...". Apesar das obrigações, a escola pode ser um lugar interessante. "É muito melhor estudar na escola do que em casa, porque estamos com os amigos e podemos ir tirando dúvidas". O que faltava mesmo são actividades: "Muitas actividades, como desportos radicais, teatro... enfim, coisas para fazer quando não temos aulas". A cantina também podia ser melhor. "Este ano ainda não comi lá, mas no anterior não era nada de especial. Só havia um prato e se ficávamos com fome as cozinheiras não punham mais". Às vezes, conta a Catarina, a mãe chega cansada e ainda tem de preparar as aulas para o dia seguinte. "É um bocado chato", reconhece. É uma das razões porque nunca seria professora. "Toda a gente pensa que eles têm férias muito grandes, mas não: é só um mês. No resto do tempo têm de estar na escola, a fazer os horários e essas tretas todas...". Além disso, "há alunos que estão sempre a chatear e por causa deles não se consegue dar a matéria toda. Deve ser fatigante e dar muito trabalho". O Ministério da Educação, garante, "não paga o suficiente aos professores para o que eles se esforçam". A posição não parte apenas do que ouve a mãe dizer. "Tenho esta opinião há já algum tempo, pelo que vou lendo (nomeadamente a "Página", onde passa os olhos por um ou outro artigo) e vendo na televisão". Pela imagem que tem da prestação da mãe, está convencida que os professores "tentam sempre dar o melhor". Só que por vezes não conseguem captar a "atenção total" dos alunos. "A culpa não é deles, é da maneira como dão a aula", explica. Alguns, refere ainda, chegam mesmo a ser uma grande "seca". "Falam, falam, falam... chega-se ao fim, estamos com sono e não percebemos nada da matéria porque não teve interesse". Outros, pelo contrário, conseguem facilmente cativar a atenção. "Seja através de jogos ou simplesmente pela maneira como se nos dirigem, a matéria entra muito mais facilmente". A Catarina acha que todos os professores deviam tratar os alunos por "tu", como forma de aproximar mais as duas partes. "Quando me tratam por "você" não gosto tanto deles e, habitualmente, tendo a estar menos atenta". Para contrariar estas atitudes, que podem fazer a diferença entre um bom e um mau professor, diz, "devia existir um curso para pequenos pormenores". Mas certas situações, admite, "simplesmente não podem ser modificadas". Um pouco como em todas as profissões, "há professores a ensinar por gosto e outros por obrigação", conclui. Uma coisa é certa: "Sem eles a sociedade não existia, porque ninguém podia ensinar aos outros aquilo que sabe". Mas isso não faz da docência a profissão mais importante do mundo. Afinal, "precisamos tanto de um professor como do senhor da mercearia...", explica. Ricardo Jorge Costa
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