O departamento do arquivo de filmes da UCLA reconstruiu e restaurou a versão original de 'The Big Sleep', que contém sequências inéditas que o transformam num filme muito diferente da versão curta conhecida até agora. Trata-se de um dos filmes maiores de Hawks e de uma obra que marcou o cinema do pós-guerra pelo seu estilo e pelo trabalho dos actores. Em Janeiro de 1945, Howard Hawks acabou com Humphrey Bogart e Lauren Bacall a rodagem de 'The Big Sleep' para a Warner Bros, mas, com a aproximação do fim da guerra, Jack Warner decide adiar a estreia, preferindo dar prioridade aos filmes ligados ao conflito mundial. É assim que, distribui 'Confidential Agent' de Robert Buckner, com Lauren Bacall e Charles Boyer. O filme é um 'flop', mas sobretudo, o público que tinha adorado Bacall em 'Ter ou Não Ter', o seu primeiro filme Hawksiano, não está longe de a detestar neste filme. Charles Feldman, o agente de Lauren Bacall, tomando consciência da mudança da opinião do público para com a actriz, lembrou-se do filme que dormia nos armazéns da Warner. Escreve então uma carta a Jack Warner: 'Dai à garota ao menos duas ou três cenas suplementares com Bogart, na mesma linha provocadora de 'Ter ou Não Ter'. Bacall estava aí bastante mais provocadora do que Bogart e foi essa insolência que seduziu o público e a crítica. Era uma coisa nova. Se esse espírito pudesse ser reencontrado por meio de cenas adicionais entre Bogart e Bacall, o que, honestamente, não deve ser difícil, penso que a garota será um trunfo formidável para vós'. Jack Warner fez projectar 'The Big Sleep' - que apenas tinha sido mostrado aos militares em serviço no estrangeiro - e concordou com Feldman. Pede então a Bogart e Bacall, que entretanto se tinham casado que rodem algumas sequências. Os dois aceitam com a condição de ser Hawks a dirigi-las. Este dá o seu acordo e, em Janeiro de 1946, toda a equipa, se reencontra para seis dias de rodagem. As novas cenas reescritas, não pelo trio original de autores (William Faulkner, Jules Futhman e Leigh Brackett), mas por Philip Epstein, o co-argumentista de 'Casablanca' , que não será creditado. No final, são acrescentados 18 minutos na nova versão, entre eles as duas mais célebres sequências do filme: os confrontos Bogart-Bacall quando este leva a jovem adormecida, e quando as duas personagens se encontram no restaurante e discutem em termos hípicos o seu potencial sexual. Para introduzir estas novas sequências, Howard Hawks amputa a versão original em cerca de 20 minutos entre elas a última sequência onde Bacall usa um véu negro e suprime uma cena de 9 minutos na qual Bogart, confronta um comissário de polícia e um juíz, explicando os diversos assassínios. Esta sequência, capital para a compreensão da história, desaparece na montagem definitiva o que transforma a intriga numa história quase incompreensível. Segundo Thomas Cantaloube nos 'Cahiers du Cinéma' de Novembro de 1997: 'A visão destas duas versões diferentes permite igualmente medir quanto 'À Beira do Abismo' é uma pedra angular na evolução do cinema de Hawks. A primeira montagem inscreve-se na linha do Hawks contador de histórias, onde toda as cenas se encaixam numa perfeita lógica narrativa conduzindo ao final. A versão definitiva marca o princípio do que caracterizará a dúzia de filmes seguintes: uma proeminência das personagens sobre a história e vontade de construir cenas, não pelo enredo dramático, mas pelo prazer da sua execução'. Esta versão praticamente inédita estreou em Paris a 12 de Novembro, teremos nós oportunidade de a ver?.
(*) 'À Beira do Abismo'
Paulo Teixeira de Sousa
|