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Formação moral na escola: qual é a nossa escolha?

"Se se respeita a natureza do ser humano, o ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral do educando." (Paulo Freire)

Não há dúvidas de que a formação moral ocorre na escola. Há, contudo, alguns questionamentos que podemos levantar. E um deles é: Em quais bases? Dentre algumas possibilidades, apresento duas que considero opostas: formação como suporte ao desenvolvimento ou formação como socialização. Defendo a primeira pela potencialidade de gerar mudanças, mas não haveria preponderância da segunda?
Análises sérias sobre educação moral hoje são possíveis porque existem bases experimentais e teóricas bastante sólidas. Em grande parte devemos isso a Jean Piaget e Lawrence Kohlberg. Para o professor Georg Lind, da Universidade de Konstanz, na Alemanha, foi Kohlberg que abriu a possibilidade de um conhecimento científico sobre uma educação moral sistemática para além da doutrinação e do relativismo.
Em "O juízo moral na criança", Piaget demonstrou que a moral desenvolve progressivamente desde a heteronomia até a autonomia. Esses dois conceitos, extraídos de Kant, referem-se à forma de obediência às normas ou regras estabelecidas. Assim, heteronomia moral é a obediência motivada por controle externo, por interesse, enquanto autonomia moral é a obediência motivada por controle interno, na escolha consciente de um princípio aceito como válido.
A promoção do desenvolvimento moral é exeqüível nos espaços escolares, na prática pedagógica, nas disciplinas e nos conteúdos. Para a educação escolar contribuir nesse processo de desenvolvimento, resumidamente pode-se mencionar o trabalho de colaboração e de mediação do professor que deve tomar o lugar do individualismo e da autoridade unilateral ou da imposição, ou seja, escolher a opção por cooperação, respeito e estímulo à consciência dos princípios universais de justiça (dimensão da autonomia moral) ao invés de qualquer tipo de coerção ou coação (dimensão da heteronomia moral).
Distantes dessas idéias aparecem as propostas de formação moral como socialização, de Émile Durkheim. Nesta, apesar de também fundada em critérios racionais e leigos, a competência do julgamento moral é anulada no sujeito, pois a sociedade é tida como absoluta e só a ela cabe julgar o que é certo e o que é errado. O indivíduo não tem vez, deve moldar-se a ela. A questão pedagógica, nesse âmbito, tem o foco na promoção da obediência às regras estabelecidas (como se fossem perpétuas) e no ajuste e adaptação do sujeito à sociedade, tendo-se como base os seguintes elementos de moralidade: espírito de disciplina, adesão ao grupo social e autonomia (aqui entendida como submissão consciente às regras sociais e aceitação da coerção do grupo; diferente, portanto, da idéia de Piaget e Kohlberg, na qual autonomia refere-se ao processo de maturação e descentração, em que o sujeito se emancipa da coerção do grupo).
Portanto, se ainda ouço no interior das escolas sentenças como "Aquele é um desajustado" ou "Inserir o indivíduo na sociedade", sou levado a pensar sobre o tipo de formação moral escolhido e a manutenção do status quo promovido.

Júlio César Castilho Razera


  
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Edição:

N.º 177
Ano 17, Abril 2008

Autoria:

Júlio César Castilho Razera
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Brasil
Júlio César Castilho Razera
Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Brasil

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