Agostinho Neto nunca quis banir a língua portuguesa
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Em entrevista do "JL" de 1 de Maio, o conhecido ficcionista José Eduardo
Agualusa, num dado passo em que começa por referir a pequena implantação da
língua portuguesa em Timor, - "Acho importante que o português não surja como
língua de domínio e de extermínio doutras. Como aconteceu no Brasil. E,
desgraçadamente, em Angola, hoje." - afirma, designadamente, a respeito de
Angola: "Os dirigentes do MPLA, sendo de língua materna portuguesa, por vezes,
curiosamente, proferiram afirmações contra ela. O próprio Presidente Agostinho
Neto, a quando da fundação da União dos Escritores Angolanos, em Dezembro de 75
(um mês depois da independência), produziu um famoso discurso, no qual dizia
que, a médio prazo, era necessário substituir a língua portuguesa por uma nova
língua feita 'da amálgama dos dialectos angolanos'. Hoje isto parece-nos um
absurdo completo, até porque já à época o português era não apenas uma língua
nacional, ao lado das outras, mas transnacional. Hoje o mais impressionante é
que entre a juventude das cidades o português é praticamente a única língua."
Com o objectivo de dissipar qualquer dúvida aos leitores da "Página" que,
interessados na Lusofonia, tenham lido o meu artigo, sobre esta matéria,
publicado no número de Agosto/Setembro de 2001, sob o título "A Língua
Portuguesa é um património comum", importa repor um facto que não se presta a
duplas interpretações, pois até consta de documentos publicados: o que disse
Agostinho Neto (não no suposto discurso da fundação da UEA, em Dezembro de
1975, mas no do acto da sua posse como Presidente da Assembleia da mesma, em 24
de Novembro de 1977), foi exactamente isto: "O uso exclusivo da língua
portuguesa, como língua oficial, veicular e utilizável actualmente na nossa
literatura, não resolve os nossos problemas. E tanto no ensino primário, como
provavelmente no médio, será preciso utilizar as nossas línguas. E dada a sua
diversidade no país, mais tarde ou mais cedo deveremos tender para a
aglutinação de alguns dialectos, a fim de facilitar o contacto."
Naturalmente conhecedor do fracasso do Esperanto, na Europa, e do Afrihili,
no Gana, também para o Presidente angolano configuraria um absurdo criar uma
única língua supranacional, feita em laboratório, para "domínio" ou
"extermínio" das línguas nacionais, representadas por nove grupos linguísticos,
ciosos da sua identidade, e cerca de cem dialectos. Pensar na "aglutinação" de
alguns destes, "para facilitar o contacto", corresponderia, no fundo, ao
processo expedito que os Serviços de Educação do tempo colonial já vinham
exercitando através de uma vasta rede de "monitores escolares" (professores
rurais nativos) recrutados regionalmente para iniciarem o contacto dos jovens
com a Escola.
De resto, além de o Português ser já mais uma língua "nacional" angolana, teria
uma virtude acrescida: não pertencendo a nenhuma etnia, era a língua que servia
a unidade nacional necessária a Angola - como já tinha servido ao Brasil. Por
alguma razão ponderosa sempre Agostinho Neto falava e discursava em Português,
mesmo entre os kimbundus, de que provinha.
Isto são factos, não são fictos... E provavelmente será lembrado no Colóquio
Internacional que a Embaixada de Angola e a Universidade italiana "La Sapienza"
vão promover, em Roma, no próximo mês de Outubro, e no Congresso Internacional
que a Sociedade de Língua Portuguesa de Lisboa e o Instituto de Literaturas
Africanas, da Faculdade de Letras de Coimbra, anunciam para o próximo ano, nos
quais Agostinho Neto será certamente evocado como uma figura central da
Lusofonia.
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Ficha do Artigo
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Edição:
Ano 11, Junho 2002
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Autoria:
Escritor - Jornalista, Porto
Escritor - Jornalista, Porto
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