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Políticas curriculares para combater o racismo

1. Políticas curriculares

Políticas curriculares constituem-se de determinações e orientações que incidem sobre atividades de ensino e de aprendizagens desenvolvidas nos ou sob a coordenação de estabelecimentos de ensino. Tais determinações e orientações são formuladas pelo Ministério da Educação, por conselhos e secretarias de educação, pela coordenação pedagógica de escolas e também por iniciativa particular de professores. Neste caso, as políticas curriculares se restringem unicamente à área de atuação destes professores, a seus alunos.
Políticas curriculares como quaisquer políticas são elaboradas e  implantadas com o intuito de promover aperfeiçoamentos na sociedade, garantir e proteger direitos, corrigir distorções, incentivar avanços. Decorrem elas de convicções, metas, projeto de sociedade concebido por aqueles que têm o poder de decidir as direções que esta sociedade segue; para tanto, precisam, eles, estar atentos às reivindicações e proposições dos alijados da vida cidadã.
Políticas curriculares, é claro, também explicitam um projeto de educação, por isso visam a que conhecimentos, valores e atitudes sejam reforçados, respeitados, aprendidos, questionados, recriados.

2. Políticas curriculares de combate ao racismo?

No caso do Brasil, país multi-étnico e pluricultural, necessita-se «de organizações escolares em que todos se vejam incluídos, em que lhes seja garantido o direito de aprender e de ampliar conhecimentos, sem serem obrigados a negar-se  a si mesmos, ao grupo étnico-racial a que pertencem e a adotar costumes, idéias e comportamentos que lhes são adversos». Isto será um dos indicadores da qualidade da educação oferecida pelos estabelecimentos de ensino, da educação infantil ao ensino superior (1).
Além do mais, conforme Kabengele Munanga afirma na apresentação do livro que organizou sob encomenda do Ministério da Educação brasileiro, Superando o Racismo na Escola(2)
«O resgate da memória coletiva e da história da comunidade negra não interessam apenas aos alunos de ascendência negra. Interessam também aos alunos de outras ascendências étnicas, principalmente branca, pois ao receber uma educação envenenada pelos preconceitos, eles também tiveram suas estruturas psíquicas afetadas. Além disso, essa memória não pertence somente aos negros. Ela pertence a todos, tendo em vista que a cultura da qual nos alimentamos quotidianamente é fruto de todos os segmentos étnicos que, apesar das condições desiguais nas quais se desenvolveram, contribuíram cada um de seu modo na formação da riqueza econômica e social e da identidade nacional.»(Munanga, 2001, p. 9 ).
Assim, pois, políticas curriculares de combate ao racismo são  basilares para superar mentalidade monocultural, informada por preconceitos contra grupos que a sociedade mantém a sua margem e denomina de excluídos, impede de compreender a diversidade de experiências, de visões de mundo. O grande desafio para reconhecer, respeitar, valorizar a diversidade própria de sociedades multiculturais está em ir muito além de simplesmente admitir que há diferenças sociais e raciais entre grupos e pessoas.

3. Papel dos conhecimentos de raízes étnicas, como a africana, no currículo

Antes de mais nada, cabe esclarecer que se entende por currículo, o curso de vida trilhado durante a educação escolar e universitária, seja no interior das instituições de ensino seja fora delas, mas sempre sob sua orientação ou influência. Currículo é, pois, processo de formação, em que, ao aprender conhecimentos significativos produzidos pela humanidade, assim como os meios de a eles se chegar, ao aprender valores e atitudes, vai-se também aprendendo a ser cidadã/ão, fortalecendo a identidade própria. 
Aprender o que de melhor têm produzido as diferentes civilizações, nos diferentes continentes, além da história e cultura dos povos que constituem cada uma de nossas nações é necessário para superar etnocentrismos, e ampliar o foco dos currículos escolares para a diversidade cultural, racial, social e econômica de cada nação.
No Brasil, por exemplo, a ação contínua e progressiva do Movimento Negro, contando particularmente com o compromisso de professores empenhados na construção de uma sociedade justa, originou  princípios que devem ser contemplados num projeto de educação nacional que preveja a participação dos negros, descendentes de africanos, ao lado dos povos indígenas, dos descendentes de europeus e de asiáticos,  tendo, pois, muito presente, a diversidade constitutiva da sociedade brasileira:
- Enfrentamento e superação de racismos, discriminações e intolerâncias;
- Reconhecimento de valores, processos de raciocínio, comportamentos próprios a diferentes grupos étnico-raciais;
- Rompimento com a homogeneidade de conhecimentos tidos como superiores;
- Tratamento diferenciado para situações, condições específicas de diferentes grupos étnico-raciais.

Notas:
(1) Parecer N° 3/2004 do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação, que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana
2) MUNANGA, Kabengele. Apresentação. In: Superando o Racismo na Escola. 2ª ed. Brasília, Ministério da Educação, 2001. p. 7-12.


  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 150
Ano 14, Novembro 2005

Autoria:

Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva
Univ. Federal de São Carlos, Brasil
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva
Univ. Federal de São Carlos, Brasil

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