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Cinema e Política ou o 1º de Maio visto por Agnès Varda
Qual é a recordação mais marcante de Maio de 2002? Jean Marie Le Pen na segunda volta das presidenciais francesas? Evidentemente. Mas também o impressionante desfile humano dessa quarta–feira, transmitida em directo nas televisões francesas, algumas tomadas de vista dos helicópteros da perfeitura da polícia, duas ou três reportagens sobre alguns rostos pintalgados, e os comentários do género “ heureusement, aucun incident à signaler “.O mesmo é dizer uma vaga rotina para os telejornais das 20 horas preocupadíssimos em não aumentar os medos de um lado e do outro de uma França ainda estupefacta. Para o cinema a história é outra. A irrupção de um acontecimento ao mesma tempo urbano (cidades pacificamente cercadas ) e político ( uma massa de corpos e slogans ) pôs em questão o seu significado.Com uma alternativa entre pensamento e acção que se pode formular assim: as imagens de cinema do 1º de Maio vão ser as dos arquivos ou as de uma intervenção militante imediata?
Agnès Varda resolveu o problema aliando os dois. Ela que não tinha “nem filmado nem fotografado” uma manifestação pública desde “ o desfile pelos mortos de Charonne (há mais de cem anos! )” achou natural “documentar um momento desta amplitude”. E acrescenta : “ Não fotografo nem filmo os “ acontecimentos”. Este 1º de Maio, manifestei-me com os outros ...e com a minha mini-camera DV.”. Ei-la pois, marchando em Paris” não de um extremo ao outro porque tenho problemas nos pés, mas duas a três horas , nas avenidas Dausmesmil e Diderot. Filmei como pude. Não me lembro de nenhuma cena em particular mas de impressões. Tentei mostrar o bom humor com que todos afirmavam o desgosto pela extrema-direita e pelo seu testa de ferro “ LE- FACHO-LE PEN”. Mesmo os que gritavam sorrindo. Fiquei impressionada pelo número de manifestantes, a calma, a incrível determinação gentil de pessoas de todas as classes sociais que estavam na rua. Havia uma verdadeira solidariedade.; homens , mulheres e crianças caminhavam em conjunto comum ritmo cada um ao seu ritmo. O meu método? Claro que não fiz entrevistas, mas filmei o que via, com especial atenção aos slogans: “ F como fascista, N como nazi” e “Primeira, segunda, terceira geração, todos somos filhos de emigrantes” . Sou filha de emigrantes gregos, isso toca-me.”
Que fazer destas imagens? Deixá-las numa caixa? Não. Uma feliz coincidência vai fazê-las aparecer como complemento da última longa-metragem de Agnès Varda, “ Les glaneurs et la glaneuse”- por cá teve o título de “ Os respigadores e a respigadora”; um filme de uma hora, “uma espécie de sequela onde encontro as pessoas dois anos depois, dando notícias suas”, conta ela. “ les Glaneurs...” terminava no 1º de maio de 2000. Vendo que se preparava a manifestação de 2002, não o poderia perder. O complemento terminará com imagens inseridas à última hora, por um atraso da montagem, mas muito naturalmente, quase organicamente juntas às outras.
“les Glaneurs et la glaneuse” saíra em DVD em França, esperemos que S. Paulo ( Branco) não demore muito mais a editá-lo por cá.

  
Ficha do Artigo
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Edição:

N.º 115
Ano 11, Setembro 2002

Autoria:

Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto
Paulo Teixeira de Sousa
Escola Secundária Especializada de Ensino Artístico de Soares dos Reis, Porto

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